Não enterrar a palavra num poema
Ou empalhá-la
Atulhando-lhe o peito
Que fica formosíssima assim
Mas morta.
Embora que pra isso
Tenha que não ter começado o que já comecei
Tenha que não ter dado o primeiro ai do resmungo que prossigo
Tenha que não ter trancado a palavra num quarto abafado sem janelas]
Tenha que não ter discordado de que ia bem a palavra sem mim
Tenha que não ter pigarreado este circunlóquio autoritário
Mesmo se acaba-se já o estrago está feito
e não adianta chorar o leite coalhado.
domingo, 18 de novembro de 2012
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
Poema de Morte II
Curvo-me ao ferro
Que não vara-me o
ventre
fica ainda acena-me
sem face sem olhos
limpo, franco
sem ranho
ranhura
Inoxidável
duro e afável e dura
deixa claro
cristalino
embrulha mo
intestino
que me pode furar
agora
não fure embora
mas pode
me fura
quer seja
Agora
ou depois e depois e
depois
tudo que sucede
agora
e torna a ser agora.
curvo-me ao ferro
que não vara-me o
ventre
agora e agora e agora e agora
domingo, 11 de novembro de 2012
terça-feira, 23 de outubro de 2012
Poema de Morte I
Projeto meu de vida
Digo
Assassinar-me um dia
O figo.
Quem morre cedo
é porque tem mais o que fazer.
Quem morre cedo
é porque tem mais o que fazer.
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
Excrever
(isto é, como em excretar)
“Defecar significa estar a só, é despejar no mundo o que,
por alguns momentos foi seu, e do que só você pode se livrar.” Rafael Sperling
como era
como era
cura
que coma o cancro
que enquanto curte
do cuarriba
encurta
vibra rasga fura escopo duro.
De lavrar velha pele, a prática
disseco tecnocrática estico
psicotelelegislossomática.
quarta-feira, 10 de outubro de 2012
Antes que eu pudesse enviar um prólogo ao meu cérebro
(título extraído de Hamlet, de Shakespeare, tradução de
Millôr Fernandes)
“Time is
just memory mixed with desire” Tom Waits
“A única nobreza do ser humano é ser esplêndido em cinzas,
faustoso em túmulos, solenizando a morte com incrível esplendor, transformando
em cerimônia e pompa a estupidez de sua natureza”. Millôr Fernandes
Sim, a hora que parecia pedir abatimento, abatimento, isto
é, a hora de se prostrar, ficar de lado para a passagem, estava aquele
estrupício, que estrupício bicho esfalfado, quando deveria aparentar
abatimento, estava o bicho lascivo, feito visse uma mulher esfregando-se em
suor e fedor, estava feito como não estivesse, ou melhor, imagine uma porta, ou
melhor, imagine um vão de uma porta, imagine parentes tristes miseráveis,
imagine, visualize agora mais realmente, este bicho, é um bicho arrastado, na
passagem, até que tocam nas costas, de porra saia do caminho caralho, na
verdade isso não é enunciado, mas subjaz em alguma parte, ele se põe de lado à
passagem, mas a expressão desta merda de coisa, não é a de dor nem lamúria
murmura pelos cantos podres de boca, prestava esta coisa pra quê, este bicho,
imagine, não erguera-se do chão havia nem uma hora, havia nem um mês, havia nem
dois meses, sem com isso querer dizer, e isto não quero dizer, que tenha
nascido recém, antes que desse cabo da posição de lado, estava nu, baixara as
calças, e já tinha pelos, evidência que não era recém qualquer coisa, senão talvez
recém feito de pelos, época de hormônios, mas não era esta merda de hormônios,
bicho odioso, é claro, aí vinham os parentes uns putos uns preocupados, uns
querendo partir a cara daquela fedelha escrota, vinham pra cima e deram porrada
naquelas porras de genitais, disse genitais não se diz genitais senão pela
clientela, disseram, se fodeu gritaram, que isso gritaram, enfiaram um copo de
água com açúcar, que o puto bebeu, bateu o copo em sua cabeça, jogou pra
depois, longe, quer dizer, e havia uma merda de um bebezinho, imagine a porra
de um bebezinho de merda, e claro, acha que seria diferente, imagine a porra do
bebezinho em cima da merda dos cacos de vidro, antes que sucedesse outro
escândalo, volte a memória de fotografia, ou seja como chame, jogou o copo, viu
o bebezinho, espatifou o copo, foi logo atrás do copo, as calças arriadas, que
não haviam devidamente subido e abotoado a modo de não cair, numa mais exata
chuva de cacos, o bebezinho seguro em suas mãos, e os parentes uns putos uns
preocupados, e outros aplaudiam, agora entenderam a performance, acredita, era
um número, o bebezinho ria, é possível que aquele naquele momento fosse o
julgamento mais principal, uma adolescente descobriu os peitos do vestido de
luto e levou a mão obsessiva e rápida à buceta, e um adolescente abriu as
calças e segurou o pau, gritaram os parentes uns putos uns escandalizados e
também preocupados, que olha o que você fez agora fodeu de verdade, mais exata,
bicho aparentando abatimento, queria quer dizer, punha o bebezinho num pouso
fortuito sem perigo, que mentira, sem perigos dos cacos daquele copo, mentira, sem
perigos óbvios dos cacos do copo, mentira, sem perigos de pisar nos cacos
naquele pedaço de chão em que pousaram, levantou as calças, e se pôs a socar a
moça, isto é, a moça estava sendo erguida pelos parentes, evidente não era
bonita, fosse bonita, provável não descobrisse o sexo daquela maneira, à
distância isto é, mas os que a ergueram claro deram uma boa fungada na buceta,
um inclusive chegou a chupar de leve, e levou um soco dela, e os parentes uns
putos uns revoltadíssimos, gritavam BRUXA BRUXA, um moleque fortuito
reconhecendo a deixa já havia alcançado álcool na cozinha e fósforos, deu aos
parentes que erguiam, ela mesmerizada, a mão enfiada na buceta, despejaram
álcool no cabelo, e fósforos, cedo queimava o cabelo o escalpo, e ela gritava
agora, dando por si enfim, aquele elo erótico e telepático com o outro do pau
na mão devidamente quebrado, que susto, isto é, na sala de jantar cantava-se
uma música sobre arreios e sela de cavalo, as taças erguidas os sorrisos os
parentes uns grandemente abertos uns feito fendas, quer dizer, apesar de triste e
miserável o encontro, não jantavam e lá, contudo, bicho fétido a enfiar a mão
nas calças buscando sua alma, alguma senda mucosa há de provê-la, a garota
gritava de dor no outro cômodo, seguro o bebezinho na sala de jantar, deixara a
presença da garota enquanto a via gritar, buscava a alma, e os parentes uns
contentes uns desolados, erguidas as taças, aquele tinir de consoantes e
ressoar de vogais nos corpos, refletiam, e podiam ver, via o esfalfado, aquela
garota feia nua arranhar-se, uns canais de sangue gradual se abrindo, agora não
era segura por ninguém, socava o rosto, gritava tal que punha as entranhas dos
parentes a vibrar, os parentes uns putos uns escandalizados, um moleque
fortuito reconhecendo a deixa pôs-se a chutar a barriga da infeliz, infeliz
quer dizer, e ela conforme cuspia sangue e gritava, isto é, aquele bicho atrás
de sua alma, voltava a mão coberta de algo negro ou era sangue demais, rubro
sobre rubro, nítido era que estava satisfeito, a sensação ruge do dever
cumprido, livra-se da coisa sobre a mesa espirra algo logicamente parece ser
sangue, os parentes uns putos uns aterrados, enquanto um não sem mesura se
curva e engole e sorve toda aquela merda, isto é, engole, a música sobre pedras
e tempo latu sensu, a garota já devidamente vestida, com as mãos em volta do
quadril pousadas sobre o pau guardado do com pau na mão, diz se mexer é bom
quer dizer amor, o que quer dizer amor, diz não foi isso que eu disse, que não
se pode suportar mais uma hora que seja daquela sala, da tarde apodrecida,
daquele senhor deitado de luto pelos parentes, dos parentes de luto pelo
senhor, dos retalhos de dias, que chamam de dias, a superposição que chamam
tempo, indistinto vagar, a justaposição que chamam anos décadas séculos, o peso
indigesto da história que antecede e sucede o ponto de breve termo quer dizer,
que quer dizer, isto é, estrupício abotoava as calças, abotoava as calças,
repara na reflexão depende de nada senão da clientela, e para, primeira vez na
vida, quer dizer, quase isso, para e olha os parentes, lembra, uma rainha
grandiosa curvada a um machado, pescoço alvo esguio, belo rosto e corpo, o
machado rasga o pescoço, a cabeça separa o corpo patético, pula num cesto, rega,
o sangue a cobre sôfrego, apenas o algodão nas narinas o senhor não sangra de
qualquer modo, mesmo o cu doente sangradouro assaz assíduo sob o traje solene
parece sóbrio, seria o estado mais elevado da civilização e cidadania daquele
senhor, mais inescapavelmente elegante, antes que se decompusesse a carne e
deselegantemente fedesse, o estado mais concreto e indelével, e entanto veja
pela primeira vez na vida quer dizer quase isso argumenta que aquilo não pode
ser, protesto por sua vez não inédito, quase isso, qualifica como impossível,
imagine, isto é impossível, isto é, os arreios e as selas, se a merda da
carapuça serviu, bicho estúpido com as calças nas mãos, basta um chute um soco,
esteja lá, os parentes uns putos uns idos, basta indispor-se, esteja lá, a moça
agora trazia a música à sala, a coisa em si, nua evidente Vênus em perspectiva
entanto ancestral rupestre, não é profética senão casual, como veio poderia não
ter vindo mas vindo não pode não estar lá estando lá, um moleque fortuito reconhecendo a deixa despe-se agarra-se às
pernas dela, pousa as nádegas ouça nádegas senão pela clientela na cabeça do
moleque, os cabelos do moleque obedecendo recuam fica-lhe um leito nu serve o
couro de pouso, cedo rosas ao redor, uma merda de um halo de luz, isto é, sim,
peso e dor sobre os ombros, taças nas mãos dos demais, este é o começo que se
curva e acolhe porrada, esteja lá, mulher afaga o bicho cansado, ele de mãos
nos bolsos, quase isso, ela quer dizer amor, nenhuma hora mais de amor, os
parentes uns putos uns ridos, a tarde ofega mas lá, o ponto antes dele nada,
entre ele e ele um ponto, bicho morto não quer morrer, entre ele e ele um
bicho, esteja lá, o ponto posto ele e nada, isto é, o bicho baixa as calças,
isto é, não esteja lá, abatimento a toda hora tudo a toa a toda hora, o bicho
estava feito não estivesse, seguras as calças, imagine, numa hora da mais pura
portanto abstrata ascese aos engulhos brutos da civilização, o bicho descobre
ter se enganado, esteja lá, os parentes uns putos uns satisfeitos, o dito pelo
não dito, o fodido pelo não fodido, isto é, o bicho abatido pelo abatimento,
esteja lá quer dizer.
terça-feira, 2 de outubro de 2012
Coisa
Enxergue-se
Não ser a coisa a coisa
Inda sendo ela aquilo
A que se referido
Tenha
A coisa está
Ali
Pra que
A si
Refira-se.
Mas longe dela
Achar-se outra
Achar-se ela
Achar-se coisa.
sexta-feira, 28 de setembro de 2012
Homem
Cá estou pensando agora
Num que gora e caga
Descoberto por um teto
Que por ora nem outrora paga
Acocorado, pois,
Se o fluxo é bruto
Abrupto a perna se molha
Ou mais abaixo
Os calcanhos, os lânguidos lanhos
Apavoram
Enfezada tez
Atesta a testa
Qual a disposição,
E por esta palavra perdão,
Do espírito que, ao lado,
Não com enfado
Disto se enamora
Nostálgico embora
Da pátria, ri.
Enfiam-se os dedos
Sem rubores, sem segredos
No cu que não dobra
Nem quando finda manobra.
A obra sem o artista
Do casal outrem dista
Só lhes fere o fedor
Estupor aos olhos e olfato
E o rapaz preocupado
Com o translado dos pares
Dá-lhes a média
Homem, de curta rédea, careta:
Lamenta a merda na sarjeta.
sexta-feira, 21 de setembro de 2012
Velho
Me dobrem
de dor
O corpo
Amassem.
Não passa
De
cicatriz
Que na
pele
Crassa
Breve
Logo
Dissolve
Quando
ossos
Roçarem-se
Sem a liga
Antes lá
Dos
músculos
Muxoxo o
opúsculo
Frouxo
Que fui.
Tempo virá
Em que
sendo
Nada serei
Senão
Algo
Algo
Sido
Alguém.
Administrado.
Quando
velho for
O nojo
Quase
inofensivo que
Hoje
Sinto por
mim
Será o
quê?
sábado, 1 de setembro de 2012
Poema de Amor V
Pegue em mim eis me cá
deixe de lá de
me largue de mim.
E milagre
de me dê amor sem desar –
de por à prova de peso
ir ou não ir se sim ou não anuir:
deixe de lá, de lado, deitado a nada,
bem o diga o dito
nada é feito conquanto sido –
e lido o livro, a lida letra,
munido tino de caneta,
sei nunca onde estive, nem me como mantive,
ao cabo do baço braço um curto pão de longo prazo,
curvo ao sol pleno dia, ombro em pelo, leve oclusa lua vira,
vi-a mas não me via,
porque não me conta,
a isto é que monta?
quarta-feira, 29 de agosto de 2012
Uma
Quando empilha e roça as magras coxas
– Possa a face roxa se aviltar –
Do feitio que não atreve à rua
Aí vejo que é mulher, ou que lembra muito uma.
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Domingo
Como ir à praça
Dar comida aos pássaros
Balançar os filhos
Em balanços fáceis
Como pular pula pula
Pedir perdão a Deus
Do outro lado da rua
Comer duzentos gramas de pastel de queijo
Na Nossa Senhora da Paz
Domingo
Leva minha carcaça embora
Me embota, me dobra e me enlata
Que a delonga ingrata demora.
Que o adubo que verta do pus
- e haverá que verta, supus -
Sirva de piso aos pares.
Que os ares o cheiro me sintam
Como eu já lhes vasto senti.
terça-feira, 1 de maio de 2012
Obituário
A tarde fototropística só não mata mais que o analfabetismo
Mas mata mais
Só não mata mais que o analfabetismo
Mas mata mais
Só não mata mais que o analfabetismo
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