terça-feira, 23 de julho de 2013

a mente é uma cova rasa


título extraído de uma entrevista com o Kerouac. Curiosamente a frase não é dele, mas do entrevistador, Al Aronowitz.

"All I ever wanted, all I ever needed is here, in my arms" Depeche Mode

Subimos uns lances de escada. Ela à frente. Estava puta, claro. Claro, mas foda-se também, ia fazer o quê? Não podia fazer nada. Que ficasse puta. Era até bom. Pra ela. Pra mim, nem tanto. Não que significasse tanto pra mim. Era mais do que uma coisa à toa. Mas não era de suma importância. Não era. Era chato porque eu ia até ela e ela com aquela lápide no lugar do rosto. Mas tranquilo. Subíamos, ela naquela respiração peculiar a esses momentos de raiva. Ruidosa. Hoje ouvi uma palavra que não ouvia há tempos, copiosamente. Ela não respirava assim. Mas quando chorava, chorava assim. Arreganhava o rosto, todo mucoso, vermelho, essas coisas. Mas não estava chorando. Subia as escadas. Decidi parar. Decidi que não queria acompanhá-la. Decidi que foda-se, eu podia deixá-la em paz. Falei isso, que ia deixá-la em paz. Ela parou. Virou-se pra mim. A distância entre nós era grande. Ela via isso. Um patamar, duas portas de apartamentos. Sem adornos, pelo menos. Fez menção de descer, deve ter pensado fala sério, continuou onde estava. Perguntou por quanto tempo. Eu disse chega não é. Ela disse é. Então beleza. Depois eu me lembro de três dias depois. Estava nu, tomava banho, havia alguém comigo no chuveiro, não, não era isso, alguém batia à porta, pergunta você tá no banho. O som inequívoco da água no chão do box achava resposta suficiente. Todo aquele som na esperança de não ser ignorado. Ignorado. Eu me recuso a responder. Olho pro meu joelho, está sangrando, pouco, mas está, me ralei parece. Um fio escorre até o chão. Lavo, arde leve, termino o banho, me seco, olho no espelho. Embaçado. Mas é justamente este o meu rosto. Que bobagem, o momento em que alguém ouvirá isto e achará modestamente interessante. Modestamente qualquer coisa. Ou idiota, o que é mais fácil. Olha o que ele disse. Todo mundo pensa alguma merda sobre o próprio reflexo. Chega. Depois lembro de uma porrada no meu cocuruto, caí no chão. Botei minha mão espalmada lá, veio com sangue e suja do chão. Ao meu lado, uma menina nua, desacordada. Parecia alguma rua, meio familiar meio não, ou um estacionamento, os fundos de um restaurante. Um leve porém claro fedor. Quando foi isso. Não havia ninguém de remetente da porrada. Tentei acordar a garota. Dizia, primeiro leve, até quase gritar foi você que me bateu. Perguntei. Aos poucos comecei a afirmar. Dei uns socos nela, como via que gostei e ela não acordava saí correndo dali. Meu joelho me puxava pra baixo. Arregacei a calça, o ralado se estendia maior pela perna. Sangrava. Puta merda onde eu estava caralho. Depois eu nuns cobertores fedendo a porra. Não meus não minha. Terrivelmente. Havia um ser peludo dormindo e roncando ao meu lado, me movi, meu cu doía. Fui em seu socorro, meus dedos voltaram com sangue e um visco outro transparente. Cheirei. Caralho, dei o cu. E nem sei se gostei. Que merda de lugar era esse. Um colchão surrado no chão, conseguiria sentir os insetos debaixo. Seria o caso de procurá-los, não. Aranhas finas apenas no melhor dos casos. Tocava alguma coisa baixo, Frank Sinatra. I’ve got you under my skin. Inapropriado no mínimo. Aquele cheiro de incenso o quarto todo vermelho calor ele suava eu também. Partes da parede descascavam uma ou outra infiltração um quadro do Paul Klee. Deve ser daqueles que a cada oportunidade cita o Angelus Novus. Umas prateleiras com muitos livros. Está escuro o suficiente pra não ler as lombadas. Por isto sou grato. Abajures vermelhos, luzes totalmente terríveis, equivocadas, perfeitas para um mau momento, me vesti. O pau do cara saindo pela coberta. E eu será que enfiei aquela merda na boca. Será que ele enfiou o meu. E eu sei que poderia amar um homem assim. Chega. Depois ouvindo conversas no metrô nunca achei que sentiria falta. Sim são terríveis. Dispenso as minhas que venha a ter com outros. Às vezes, poucas, bem poucas, alguma alheia que interesse minimamente. Nenhuma que valha a pena. Sim, é uma pena pesada. O réu é sentenciado a ouvir por árduos anos, quantos durarem sua vida, conversas alheias. Notícias gargarejadas. Ou seja, tantos anos quantos forem sem saber quem são os personagens das histórias, pegar trechos desconexos que nunca encontrarão conexão entre si, histórias eternamente sem desfechos. Jamais essa conexão tão banal quanto remota. Um fio numa tomada. Me faltavam dois dedos na mão direita. Vomitei. Que merda era essa. Olhei pros lados puto. Sujo. Vomitei em cima de umas senhorinhas. Quanto tempo próximo sangrava. Todo mundo meio caralho que porra é essa mas uma parte meio foda-se também. Meio ih fodeu um maluco brabo. Virando a cara e torcendo pra eu não enxergar ninguém. Mas eu queria a porra dos meus dedos. Caralho, tava sangrando pra cacete ainda. Aquela mistura nojenta no chão. Me tiraram eles agora e eu não vi.  Nem quem nem dedos. Acharam terrível o vômito, mas o sangue ok. Era isso pensei quase perguntando. Eu queria meus dedos. Não que eu precisasse, mas gostava da simetria das minhas mãos. Ah sim pensei. Soquei a parede até quebrar os outros dois dedos correspondentes da esquerda. Arrancar seria complicado assim, sem ferramentas. Estava numa fila de banco, agora sentia meu corpo mais curvado, a minha barriga entrava em meu corpo, não queria protuberar-se. Sentia que cada passo era tremura, hesitação em geral. E se eu hesitasse para sempre. Senhor, alguém me chamou, próximo. Quanto tempo próximo me chamavam. De repente usei meus olhos e compreendi que não enxergavam. Diante de mim o guichê. Eu disse isso perdoe não enxergo nada. Nada perguntou. Nada quer dizer enxergo tudo embaçado. Demais. Tente seus óculos. Sim, botei-os, alguma coisa melhorou. Meus olhos expiaram quer dizer expiraram. Quando foi isso. Vi que havia algumas contas em minha mão, supus que houvesse dinheiro na minha carteira. Fui até ela. Não abri, me detive antes. Minhas mãos estavam manchadas. Manchas de pele marrons de velho. Lá não estavam meus dedos. Dessa vez os quatro. As veias todas à mostra. Senhor. Só um instante. Um cara atrás de mim bufou porra. Olhei era um velho. Me olhava querendo me matar, mas distante. Uma intenção verdadeira e fictícia. Concluí que isto era importante para ele. Pode passar. Ele passou bufando e resmungando. Era gordo e parecia prestes a morrer. Manchas, falta de fôlego, cheirava a cigarro e perfume, a mistura caía-lhe bem, devia ter um saco grande e um pau ignorável ou de todo modo inútil. Quantos problemas, arrastar todo aquele peso por aí. O corpo não aguenta nem sequer a si próprio. Quanto mais o quê. O cara do guichê olhando pra ele. Agora ouvia com atenção a voz dele, era rouca, entrecortada, parecia a pior voz. Onde estava minha carteira. Fui dormir. Aconcheguei-me entre umas pessoas pouco incomodadas. Com cara de tudo bem. Quase me apaixonei assim. Escuro. Uma delas passou a mão nos meus ombros. Vi que estavam ligeiramente recurvos, lembrando um urubu. Sorri. Ela não. Quando foi isso. Continuou, eu vi que não era comigo, mas com meus ombros. Tratei de quedar-me. Não era comigo. Algumas tentavam se beijar. Ou pelo menos parecia. Uma outra começou a tirar minhas calças. Não reconheci minhas pernas. Estavam chupadas. Meus joelhos eram carne estragada. Ainda havia pés. Que horas eram. Perguntei. Deram-me um soco, cedi, teria caído não estivesse espremido entre todos. Fatiaram minha orelha. Gritei. Ouvi que não reconhecia o som. Puxaram meu pau pra fora mandaram mija. Eu ok. Mijei. E aí vocês não são tão terríveis assim mijar eu mijo toda hora. Eles assentiram. De fato. Vozes miúdas, quase não estavam lá. Apenas a dor me convencia. O mijo era demais. Uma coberta natural me aquecia. Tudo de que preciso está aqui, em meu corpo. Lembro de quando ela me disse algo parecido. O Enjoy the Silence do Depeche Mode que todo mundo conhece. Mas era mentira. Tudo se provou mentira. As mentiras se mantiveram mentiras, o que parecia verdadeiro se provou mentira. Rápido. Rápido. Nunca soube bem o que fazia. Jamais o que faria. Impossível dia seguinte que virá. Que viria. Rápido. Qualquer parte. Sair daqui o quanto antes. Não que o passo à frente não seja o passo atrás, que este lugar não seja o último, como foi o último. Mas sair daqui. Chega.

domingo, 14 de julho de 2013

Basbaque VI


nutriz de guerreiros, nutridora, terra, toda a terra amua, crua cura dura, a fria frota de altares transportados via mares revoltos, devagar com o andor, o santo é de sarro, cada vez que dá um ai, meu tarô me convoca, minha mente amua, pudor encrua, pústula nua, múmia amua, o tarô me convoca, breca o ir-me-se-me, sempre que paro é que estou sendo parado, eu já nem estou neste país, resta um rosto amargo de canto de boca, uma lembrança modorrenta amorosa aziável pouco aprazível, senão então, eu já nem estou neste país, de tal modo tanto ou tudo me é alheio como o suor da roupa de outro sujeito que visto, a roupa, isto é, a roupa é que visto, não o sujeito, interpõe-se entre eu e quemquerque um manto diáfano, algo principalmente que dilui sua imagem em outra coisa qualquer, fantasia, filha, ela arranca a rolha da garrafa e abre um vinho terrivelmente doce, seu doce ocre seio, que quase me a faz odiar, me fá-la qual, Que merda é essa, O quê, Que merda de vinho, É? eu gostei, Eu achei uma merda,

lembro da frase no Bertolucci, a rua invadiu o quarto, a medida, o corte de invasão de cada coisa sobre outra coisa, o primordial e o derradeiro, o esperma e o verme, Falta-me fibra, falta-me finar o fio da meada, falta-me quê

subterrâneo crânio
brame e brada
acima a tez atina à lida e larga

subterrâneo crânio
plácido paira
cima cinge a meninge inflama e mata

subcutânea gruta
Imputa dor
Ao fino linho filho brio

subcutânea gruta
Em bruta dor
E dor e dor e dor.

A conversa totalmente ela própria a conversa mesma com um amigo, cervejas e risos tudo sob controle nada prestes a desabar, uns mendigos caídos na Lapa autodevassados e os caras que vendem amendoim, o sorriso e um espasmo anestésico, que me reserva em termos de sensação?, a assombrosa expectativa de possivelmente não sobreviver e tornar-me zumbi, onde estive todos esses dias?, já sei que já estou quase aqui, mas a brisa, diz Siba, por ser carinhosa é quem mais tem castigado, cada vez um afago e eu mais perto da grande humilhação,

como assim?,

e a galera morrendo pelas ruas e cantos, se esfregando e arrastando os pés quebrados, as crostas sujas de suor seco sexo em toda parte, as secções no cérebro, nos ombros e abdômen, nos genitais, essas coisas, cada vez um afago e eu mais perto da eterna humilhação, 

sábado, 13 de julho de 2013

Trauer

"Se algum dia você precisar da minha vida, venha e tome-a" Trigórin, citado a ele próprio pela Nina, escritos, todos, pelo Tchekhov, na Gaivota.

Quero morrer como um baseado. Burning out & fading away. Ser e não ser. Morrendo dançando, exaurindo, a carne sumindo dos ossos, empalidecendo, aqueles socos do som que agridem as caixas e um baixo que me trema os órgãos. As veias assomando à superfície, o sangue sedimentando nos fluxos lentos do leito. Os ossos desmoronando, os tendões rasgados. Tudo isso com a vida empesteada pelo corpo, até o último silvo da bomba do coração. Meu cérebro terá já há muito ido embora, - as sinapses nervosas foram bloqueadas e infiltradas e atrofiadas de modo que o cérebro não pudesse mais emitir ordens. Estava preso dentro do crânio, completamente lacrado. Por algum tempo ainda era possível enxergar por trás dos olhos o sofrimento silencioso e impotente do cérebro, até o dia em que ele finalmente acabou morrendo, porque os olhos se apagaram e não demonstravam mais emoções que o olho de um caranguejo na extremidade de um pedúnculo [Burroughs] - a decisão inicial empreendida pela via do cérebro, um suicídio consentido, autoeutanásico, é disso que sempre se tratou. Qual era o momento que eu esperava. Qual era o momento, a vida é simplesmente o caminho de achar o lugar em que se morrerá. É aqui. Chega. Um abraço. Todas as vezes que não cheguei às vias de fato na empresa contra mim era consequência disso: julgava ser aqui, me parece ainda que é, mas sinto que não, devo ainda me arrastar por algum tempo. Que pensam os que vão ao termo? Isso é quase uma paráfrase do Drummond, viver pra mim é vontade de morrer. Meus paralíticos sonhos desgosto de viver. Viver pra mim é planejar a morte, escolher o que queremos que nos seja subtraído, e do que queremos ser subtraídos, amputados, isto é, escolhendo nossos amigos, quem queremos que sinta nossa falta, não pelo puro prazer frugal de se sentir sentido, (aqueles prazeres patéticos, quem vai chorar no meu funeral, o Nelson Cavaquinho e o Guilherme de Brito falam sabiamente, eu troco seu choro por mim, sua homenagem a mim depois de morto por alguma coisa que você faça hoje por mim), mas pra ter a certeza de ter visto e sentido em muitos a vida em pessoa. E eles em nós, reciprocamente. ("Nada é recíproco", onde ouvi isso?). Não a certeza absoluta, claro - certezas sem certidões. Mas eles, por serem a vida, todo o amor se converte em seu contrário, perde-se eles, perde-se a vida. O amor converte-se não pela bobagem de que não vai durar, que por não durar deve ser chorado, Freud já disse o contrário, que por ser pouco duradouro é tão bonito, uma paisagem, uma pessoa, [A transitoriedade], já disse o Itamar Assumpção, isso não vai ficar assim, meu bem, por isso beije-me. Puta que pariu agora, pelo amor de deus. Contrário de amor aqui não ódio, mas desespero, numa potência contrária, mais que o literal suposto contrário, ódio so called, sem falar da proximidade entre ódio e amor, não se trata de amor/ódio, quem briga ama, quem ama briga, esses lugares comuns, porém acertados, mas outra coisa, escolher quem se ama é escolher quem nós queremos que tenha poder para nos matar, é dar a vida nas mãos de um outro, diluir-se em outro, faz o que quiser com isso, eu não sei direito o que fazer, você parece ter se interessado, eu nunca usei muito, não, pode ficar, é, eu só tenho essa aí, mas fala sério, tá pegando poeira lá em casa, é bom que pelo menos alguém vai usar, se ficar comigo, vai ficar parada, eu vou olhar pra ela, ela pra mim, e vai ficar nessa, fica contigo, é até bom, de repente eu fico com ciúmes e resolvo pegar de volta, quê?, é, eu tô só te emprestando, ah, você quer pra você pra sempre? Tipo dado?, ah tá, sei, bom, isso já é outra coisa, se bem que ok, tá, leva, é, leva, não tô fazendo drama não, pode levar, isso já tá há tempo demais comigo.


**
sut:
Pegamos um táxi na Urca. Encostei minha cabeça no ombro dela. Afundei no banco, depois em mim, nas dores do intestino. Ela ali comigo. Eu olhando a rua, a chuva, as pessoas atravessando a rua, as gotas distorcendo a visão pelo para brisa, eu pequeno, pequeno não sabendo as trajetórias daqueles carros, daqueles pedestres, atravessando entre os carros, dentro e fora da faixa, os olhos iluminados como bichos na estrada, o susto imóvel e confuso dos bichos, violentos, fazendo tão pouco sentido, não sabendo por onde íamos, sabendo apenas de onde saí e para onde ia, não sabendo por onde, como era quando eu era criança, eu não entendia os caminhos, me abandonei naquele momento de tal modo, de tal modo criança, que morrer poderia ser fácil, ser um passo seguinte, tão óbvio quanto ter entrado naquele carro, sem nenhum peso, sem nenhuma morbidez, mas aquele amor preocupado e firme do osso do músculo do sangue da Luísa, aquele amor era a garantia de que se eu morresse ali, estaria seguro.

luísa:
Ele me dobrou de novo,
foi o que eu pensei
quando você encostou a cabeça no meu ombro dentro do táxi.
E não foi a primeira vez. Abraçar o amor e a vida, você disse, e conseguiu,
de novo. E aí pang, domingos terríveis, você nunca vai entender,
vai?

O filme era ótimo.
Pang
de novo.
(Beauvoir me deu vocabulário
para o que eu não tinha
palavras.)

E Tim Maia cantando o que eu gostaria de dizer pra você, às vezes no silêncio da noite e todo o resto, cada palavra.

A compulsão da escrita.
Nada mais a dizer e continuar
escrevendo, lá no fundo
aquela sensação de que algo foi modificado para sempre.
Agora descobrir se para o bem ou para o mal.


**

"'All is lost. All is lost.' It's all I've ever written" Cronenberg e/ou Burroughs. Naked Lunch.

Stravinsky fagoteoboeicamente arrulha dissonante que nem tudo está perdido. Nem tudo: apenas. Stravinsky me lembra de todos os finais que vislumbrei ou sobre os quais tropecei. Todos os cortes que me vararam o ventre, como se meu ventre fosse infinito e o corte nunca concluísse. Como disse o Mutarelli, seu som soa no ritmo em que vivo, sinto e penso. Stravinsky vem me dizer que nada está por ser achado. Não que a vida esteja feita, concluída. Mas que nada está por ser achado. Não que eu seja hoje tudo quanto possa, o máximo, do que algum dia poderia ser. Mas que nada está por ser achado. Não que eu ainda não vá viver longos anos, (Paciente da Kehl: "Sei que daqui a um ano vou me sentir melhor. Um ano passa rápido. O que demora a passar é um minuto"), felizes e miseráveis. Mas que nada está por ser achado. Não que hoje eu não ame e odeie e desespere e não vá mais amar e odiar e desesperar. Mas que nada está por ser achado. Não que eu não possa rir do que é engraçado e chorar do que é terrível. Mas que nada está por ser achado. Não que qualquer coisa não. Mas que nada está por ser achado. Não que tudo esteja perdido. Mas que tudo está perdido. Quer dizer, que nada está por ser achado. Nada. Não que mas.

Nada está por ser achado. Não que eu não vá procurar oquequerque, não que eu não vá achar oquequerque, não que oquequerque não vá me mudar, não que eu não vá mudar o quequerque, não que eu morrendo, transformando-me, não deixarei sempre de ser o que era pra ser outra coisa. Mas que nada está por ser achado. Não que eu não vá descobrir outras coisas, outros rostos, outras maneiras de sofrer, de gozar, não que mas, de pensar, de foder, de beber, de comer, não que eu não vá descobrir bares recônditos e charmosos em ladeiras do Catete, experiência de suma tranquilidade e paz que quase me faz chorar pela nostalgia futura que me abate, a luz amarela sol indoor noturno wáttico halando pelo teto e paredes e os demais presentes, as suas conversas que, graças aos deuses, não ouço, senão belos ruídos, alguns homens bonitos, algumas mulheres bonitas, outros não, outras não, uma cerveja impossível no copo em minhas mãos, e uma mulher, minha companhia, ela disse alguma coisa, me fez rir, o riso dependurou-se um momento mais do que eu planejava pra ele, o tempo de me fazer pensar, o tempo de se tornar outra coisa, perdi o controle, e talvez seja ótimo, ou talvez apenas seu rosto se apague, toda a luz do bar em seu rosto desvaneça, esse rosto liso e negro, sem olhos, boca, nada, é esse vazio (o resto não, o corpo não, um belo vestido e decote, pele branca, etc.) que logo depois se alumia, foram uns dois três segundos escuros, e vejo sua expressão, a pele do rosto esticando e contraindo, os dentes, a cor dos olhos em trânsito, ela ri e pergunta o que estou pensando.

Foi assim?

quarta-feira, 3 de julho de 2013

(pai)

Algo, mas que bobagem, aporte poético póstumo, uma vez à estante de uma Travessa lendo distraído umas coisas do e.e.cummings. Tentando demover-me da convicção de ser um idiota alienado, ensimesmado (não faz mais sentido agir contra que convencer-me do contrário? ...é disso que estou falando). Sob Otis Redding, sitting on the dock of the bay.

"Now you are here. It's 7:43. Now you are here. It's 7:44." Synecdoche, New York. Charlie Kaufman

E?u Si?m?e?herda
U?ma(mãe) horda
ho?ras (gue) (ras)às horas róseas

capaz (p)?ai
ama(n)ssar-me amor(-me)
amor-te-ser (vir)-me
ser-me
morto
morta rta tártara rta
artéria rta tétana tânata aorta rta rota
ratifica fixa
crucifixa
trúcula*
(tru) se dar
truco lento
truculência
falência múltipla
trúcula trúcula trúcula

cada fracasso no seu galho.

[* este e os três seguintes escritos pela Luísa, o terceiro eu mudei, e o quarto foi motivado pelo acréscimo dela]